Editorial Rede 19

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Ser palhaço é, talvez, daqueles mesteres mais incompreendidos e vilipendiados. Considera-se ser uma profissão menor, ao que não é alheio o facto de se dar mais importância ao “comediante” e ao “humorista”, que são reconhecidos por fazerem, terem ou construirem piadas ou situações mais ou menos jocosas. A própria expressão “ser um palhaço” tem uma carga tão depreciativa que, não raras vezes se associa ao fracasso ou desilusão. Longe vai o tempo em que se ia ao circo onde o auge da programação era a prestação do palhaço. Hoje, nem uma coisa nem outra.

Aprendi, por força de algumas circunstâncias especiais e vivências, algumas delas em plena atividade profissional, a dar valor e mérito aos palhaços. Para felicidade deles, as crianças ainda são dos poucos que os apreciam e lhes dão a importância que merecem. E, bem vistas as coisas, falamos de gente que se esgadanha para dar aos outros um pouco da felicidade que eles próprios podem nem ter.

A partir do momento em que pinta o rosto de vermelhos e brancos intensos, veste aquela jaleca comprida e multicor a condizer com os sapatos onde parecem caber todos os segredos de uma vida, o palhaço é-o para os outros. Não importa se está contente ou triste, se está bem na vida ou atravessa  um deserto de sofrimento… No seu palco, estampa-se com um riso de orelha a orelha na face e assume a sua condição de servir travessas de felicidade e alegria em doses bem generosas. E é disso que se trata: de generosidade às carradas. Dizem que um palhaço finge. Não, não finge, nem pode fazê-lo. Não é capaz de fazê-lo, porque é a sua condição: ser palhaço, jogral, histrião, polichinelo, bobo, arlequim, truão, chocarreiro, saltimbanco. Tudo isso, e ele próprio. Tudo isso, é ele próprio.

E é assim, a vida do palhaço. Ninguém quer saber quem ele é antes e depois daquele momento. Mas ele sabe que é aí que se constrói, se destrói e se volta a construir. Sendo ele, deixa de se importar consigo para que a sua audiência, aqueles para quem vive, suba ao monte das bem-aventuranças e aí queira permanecer o resto dos dias, onde a alegria parece não acabar. 

Ninguém tem mais amor do que quem dá a vida pelos seus amigos. (Jo 15, 13)

Vem este assunto a propósito da entrevista ao diácono Rui Ruivo, que hoje é destaque na REDE. Lá para o fim da conversa deixa escapar o desejo de “ser palhaço de Deus”. Para quem não perceber o alcance mais profundo da expressão, soa a ligeireza, imprudência e alguma leviandade. Em boa verdade, é a analogia definitiva do que é ser ministro de Deus: viver para dar-se aos outros e dar-lhes a esperança e a alegria de acreditar. 

Manifestei-vos estas coisas, para que esteja em vós a minha alegria, e a vossa alegria seja completa. (Jo 15, 11)

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